Já todos se queixaram do calor repentino que se fez sentir no início da semana…agora que a semana se aproxima do fim, eu não me queixei…
De véspera, deixei a Vila, de olhos rasos de água:
“- Ficava, agora, aqui uma semana” – de olhar perdido no mar.
“- E porque não fica?!”
“- Não posso…melhor, não devo…” – balbucio lentamente – “estou cheia de trabalho” – esta frase coloca-me de novo encurralada – “mas ficava, acreditas?, só com a Pipoquinha e os meus “melrinhos”, que me adoram…só…mas lá para o fim do mês que vem, tiro uns dias” – a ideia devolve-me o sorriso.”
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“ – Basta olhar para si para ver que chegou o Verão” – diz-me à laia de cumprimento.
“ – Achas?!” – entre o radiante e o inseguro – “Pareço uma hortense!” – largo numa gargalhada.
“ – Nem é preciso sentir a temperatura, basta olhar para si” – insiste a vigilante-segurança, e ainda é tão cedo…
“ – Bem, deixa-me ir: sou uma hortense “mascarada” de arco-irís…” – e afasto-me, chocalhando os brincos e o colar de mil-cores. “Ontem custou-me tanto, mas tanto, a ideia de vir…”, chuto por cima do ombro, afastando-me a passos largos.
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Fecho-me. Nos ouvidos, música da época a bombar… mas a bombar mesmo! Grande espectáculo de playback! Ao vivo! Para trás, ficaram as pieguices, agora são as “imortais”, as velhinhas, puro rock, as clássicas, as de sempre. Encarrapito-me na secretária, com o flip-chat em frente, alterno marcadores coloridos, que utilizo como microfone e ajudam-me nos solos de bateria*.
A empresa está quase vazia [pudera, com este tempo maravilloso, só meia-dúzia de tótós e esses não me estranham: entre o olhar perdido nas nuvens, avaliando a velocidade do vento sul no Inverno ou o show de Verão, ninguém estranha. Traduzo para o papel a ideia do fim-de-semana, já atirei as sabrinas para um canto e balouço as pernas enquanto esboço. O tempo passa, devora-me sem dar conta [hum, tenho que ter cuidado: já na semana passada “senti” o vírus envolver-me e tenho que o combater…não, workolic nunca mais].
Quase ao fim da tarde, o chefe aparece, e “visita-me”. Retiro os phones e escuto:
“- Vai para a praia?” – pergunta, com um sorriso irónico.
“ – Mais tarde, já-já não posso” – é melhor assim, ignoro: se se refere aos pés descalços, à flor que já vai quase na ponta dos cabelos e ao poncho transparente, de franjas espaçadas e fininhas, que me escorrega pelos braços [LM e eu comprámos “um lote” deles há uns anos, numa loja que já não existe e estes ponchos sempre suscitaram curiosidade aos meus colegas, não percebo porquê…]…travo o olhar na camisa Desigual que enverga…e o meu olhar diz tudo: muito adequada, também, por acaso… - “veja o que estou a inventar” – apelo, utilizando uma régua de 40 cm para expôr, na falta do ponteiro luminoso. Escuta-me, acenando com a cabeça, em sinal de concordância. Por fim: “Dê-me um cigarro, vamos fumar.”
Saltito da mesa, calçando-me, contrariada. Quer “falar”. Esfrego as sobrancelhas, enquanto debita pelo corredor: “…vamos patrocinar os motards…blábláblá…já viu o mail? Para a semana, vamos para Córdoba…”
Vou escutando, enquanto o ar quente da rua me envolve, transportando-me para outras paragens e continuo acenando a cabeça, não me resta outra opção. Vou escutando…
“- Fui! Para mim, a-c-a-b-o-u! Vou às Docas, celebrar este lindíssimo fim de dia, beber um copo…”
Olha-me, muito sério:
“ - … de água, de coca-cola, não se assuste!” – largo numa gargalhada – “Quero ver o pôr-do-sol, quero dançar…Beeeeijos!”
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“ – Quero música boa, se faz favor, quero cantar, cantar tudo a que tenho direito…” – enquanto prendo o cinto.
“ – Às suas ordens, madam! Que tal o dia?”
“ – Perigoso: “entretive-me” a trabalhar, são os primeiros sintomas…Quero cantar, se não te importas, músicas do nosso tempo…” – insisto, “batendo com os máximos”, num tom que não admite recusas.
“ – E que tal 6ª, a festa na Kapital? Tem tudo o que gostas…”
“ – Nem pensar! Quero ir cedo para a Vila, só penso nisso: esta semana é tremenda, é a Feira do Livro, com concertos e Happy Hour a partir das 22:30 h, é os Mão Morta no Coliseu [não gosto, mas o Fernando Ribeiro vai cantar um dueto com o Aníbal Canibal Animal Qualquer-coisa-que-rime…e é uma grande tentação!], é uma moça qualquer no Pav. Atlântico, é um moço que gosto, David Craig, não sei onde, no Lux?… e eu ando endiabrada! E além disto tudo, tenho vida, né?”
“ – E que é isto senão viver?...”
Eu não digo?! Somos [demasiado] iguais, for God sake…
* Os meus solos de bateria assentaram nisto:
3 comentários:
Estou gostando cada vez mais daquilo que escreve, mesmo que possa fantasiar um pouco, tem mum toque de realidade muito grande, mostra uma vida "agitada" mas feliz, com tudo a que tem direito...:):):)
Aproveite bem, sei que aproveita!
Abracinho
Aqui não houve lugar a fantasias, Maria Teresa, inclusive algumas "loucuras" foram suprimidas :) Tenho dias verdadeira/ surreais, rodeada de doidos...Beijo Grande
Eu não me queixo do calor... parece que toda a gente fica mais alegre!
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